7 em Linha directa – Entrevista ao Prof. Miguel Oliveira sobre um dos projectos mais arrojados do desporto em Portugal

Miguel Oliveira é Prof. na Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física na Universidade de Coimbra e está ligado ao badminton há largos anos. Actualmente Miguel Oliveira tem em mãos um projecto arrojado de uma academia de desporto que irá abranger 8 modalidades, todas elas Olímpicas.

1 – Linhas & Finas/+badminton – Como nasceu o projecto da CSA – Coimbra Sports Academy e que impacto vai esta ter no desporto nacional?

Miguel Oliveira  – A Coimbra Sports Academy (CSA) nasce como resposta aos problemas, identificados por muitas pessoas ligadas ao fenómeno desportivo (atletas, treinadores, dirigentes, pais),  que os jovens atletas enfrentam diariamente, como sejam: locais de treino inapropriados, horários de treino perfeitamente desajustados, necessidade de "optar" frequentemente entre treino ou cumprimento de tarefas escolares, fraco ou inexistente apoio médico-desportivo já para não falar da inexistência ao nível do treino mental, muitas vezes rácios treinador/atleta que impedem o otimizar das suas capacidades, falta de divulgação e de gestão do seu projeto/imagem e, simultaneamente, ausência de uma estratégia e planeamento adequados para construir uma carreira desportiva. Após identificados os problemas reunimos um grupo de trabalho que, ao longo do último ano, tem analisado os diversos constrangimentos, estudado possíveis soluções, auscultado entidades e proposto parcerias, estando conscientes que, em face da atual conjetura económica do nosso país este projeto apenas seria exequível se conseguíssemos motivar e criar as necessárias sinergias entre uma série de instituições. Quanto ao impacto da academia no desporto nacional somos suspeitos ao emitir opinião – acreditamos que vamos ajudar a mudar mentalidades, que estamos a implementar um nova solução, exequível, e da qual esperamos resultados bastante positivos, e que após um ou dois anos de trabalho outros nos sigam, noutros locais do país, desenvolvendo projetos similares, sempre no sentido de melhorar as condições de prática e o rendimento desportivo, a par do desenvolvimento dos seus percursos escolares.

2 – L&F – A academia irá substituir os CAR existente no pais, ou irá trazer uma mais-valia para os atletas, já que como sabemos a maioria dos CAR não conseguem trabalhar o ano inteiro com os atletas de alta competição?

M.O. – Não pretendemos substituir os CAR. Assumimo-nos claramente como uma solução diferente, a qual prevê uma intervenção nos atletas sinalizados muito mais precocemente, lhes proporciona um acompanhamento completo e permanente, e acredita na exequibilidade do paralelismo com o percurso escolar, ainda que com as adaptações necessárias. Orientamos os atletas para o rendimento ao mais alto nível, ou seja para a alta competição. Seremos uma opção, não um caminho exclusivo. Seja a partir da iniciativa individual/familiar, seja por parcerias estabelecidas com federações desportivas e outras entidades nacionais, e mesmo com clubes/associações, daremos a resposta adequada.

3 – L&F – Neste projecto com que parceiros estratégicos vai poder contar a Coimbra Sports Academy?

M.O. – Estão a ser protocoladas parcerias com clubes, associações e federações desportivas, mas também com as entidades da tutela do desporto e da educação, para além das entidades governativas locais. Existe uma residência com todas as infraestruturas necessárias. Estão também envolvidas algumas marcas desportivas que, atuando como sponsores, acabarão por ter um papel muito importante na formação dos atletas. Para além dos espaços desportivos existe toda uma equipa humana para assegurar todo o processo de formação dos alunos-atletas. Durante a próxima semana ficará online o nosso site, existindo no mesmo uma brochura digital com informações muito completas. Não gostaríamos de nos adiantar à divulgação oficial, até porque alguns dos protocolos ainda estão a ser finalizados.

4 – L&F – Quais os principais objectivos com a criação da CSA – Coimbra Sports Academy?

M.O. – Os principais objetivos da CSA são dar resposta aos problemas identificados e, anteriormente indicados na 1ª questão – proporcionar as melhores condições de treino (espaços, técnicos, apoio clínico) construção e gestão de uma imagem e projeto de carreira, estabelecer uma correta articulação com o percurso escolar, obviamente diferenciado, preparar o acesso ao ensino superior (quando for essa a opção), encontrar soluções para o pós-carreira desportiva (não esqueçamos quantas vezes esta é interrompida por tão diversas circunstâncias).

5 – L&F – Vai ser possível em Coimbra e mais concretamente na academia, os atletas conciliarem os estudos com o seu desporto de eleição, já que sabemos que na maioria dos casos em Portugal tal não é possível?

M.O.  – Nas modalidades desportivas que intervimos sim. Ao nível do 3º Ciclo e do Ensino Secundário os alunos terão horários adaptados (10.35h às 16.25h), existirão apoios tutoriais, reposição de aulas quando os alunos-atletas se ausentem para estágios e competições, épocas extraordinárias de avaliação. Tudo é pensado no sentido que os jovens tenham o tempo devidamente distribuído entre treino, escola, recuperação/descanso, estudo. A alimentação, os tempos para dormir são fundamentais. Os nossos tutores residenciais farão um acompanhamento exaustivo dos jovens, estando em contacto permanente com as equipas técnicas, psicólogo, diretores de turma, subdiretor para a Área Pedagógica da CSA. Ao nível do ensino superior estamos a trabalhar no sentido que todas as condições contempladas na legislação relativa aos atletas com Estatuto de Alto Rendimento sejam efetivamente cumpridas, e que cumulativamente as mesmas sejam extensíveis aos outros atletas – para tal, a oportuna publicação do novo Estatuto Aluno-Atleta, bem como as condições para os atletas que representem a Universidade de Coimbra nas competições universitárias serão uma importante ajuda. Outras iniciativas estão em fase de proposta pelo que, não nos poderemos pronunciar neste momento.

6 – L&F – Com que idade, ou anos escolares, estão a pensar para o arranque da academia? A CSA está aberta apenas a atletas que morem em Coimbra ou no seu concelho, ou terá alguma residência para aqueles que queiram vir de fora para treinarem e estudarem em Coimbra?

M.O. – Na CSA estamos preparados para acolher atletas a partir dos 12 anos de idade – 3º Ciclo do Ensino Básico. Neste primeiro ano/época, 2014-2015, iremos iniciar com 3 turmas – 8ºano, 9ºano e 10ºano. No ano seguinte iniciar-se-ão as turmas dos 7º e 11º anos, deixando para 2016-2017 a abertura do 12ºano. No entanto, a partir já deste primeiro ano letivo, daremos resposta a eventuais alunos-atletas que integrem este projeto e que venham a frequentar os anos de escolaridade não programados para iniciar em 2014/15 – a única diferença é que não estarão integrados em turmas dedicadas mas, terão exatamente todas as restantes condições dos seus colegas. A academia receberá atletas de todo o país, desde que cumpram os níveis de exigência para o trabalho a desenvolver, e também atletas de outros países. Usufruiremos de uma residência com quartos individuais, refeitório, salas de estar, biblioteca e salas de estudo, para além de alguns espaços de jardim para convívio ao ar livre.

7 – L&F - Acha então possível que relativamente ao badminton, esta academia seja uma mais-valia, já que com as condições, quer de alojamento, quer de treinos, alguns jovens atletas com o apoio dos seus pais, decidam ir para Coimbra, onde posteriormente também sabem que podem prosseguir os seus estudos na mais famosa universidade portuguesa?

M.O. – Pensamos que sim. Para além de uma equipa humana que cobre uma série de áreas do desenvolvimento destes alunos-atletas, para além das condições de espaços desportivos, Coimbra beneficia claramente da sua localização geográfica, de ser uma grande cidade, com todos os serviços, mas que facilmente se atravessa em 10 minutos, para além da grande mais-valia que é Universidade de Coimbra. Os jovens começam a atingir os seus melhores níveis de performance perto da idade em que ingressam, ou ingressaram há pouco, no percurso universitário – temos que ser realistas, em face das fracas possibilidades oferecidas para uma carreira desportiva profissional em exclusivo, com excepção de muito poucas modalidades, poucos serão os jovens que deixarão os seus estudos para se dedicarem em exclusivo ao desporto. E ainda assim, nos casos em que tal é possível, há que equacionar, e possibilitar, uma formação profissional, nem que seja após o términus da carreira desportiva. Dificilmente, se encontrarão reunidas as condições que existem em Coimbra, noutra cidade portuguesa.