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segunda-feira, 23 de maio de 2016

Entrevista de Marco Vasconcelos à Gazeta Esportiva (Brasil) - O Madeirense treinador da selecção brasileira na 1ª pessoa

O português Marco Vasconcelos chegou ao Brasil no início de 2013 para preparar a equipe nacional de badminton para as Olimpíadas do Rio de Janeiro. Deixou mulher, dois filhos e o conforto de sua casa na Ilha da Madeira, onde nasceu, para morar com atletas em Campinas e ouvir piadas por causa do sotaque. Tudo para ter novamente a sensação de desfilar na cerimonia de abertura dos Jogos.

Vasconcelos esteve como jogador em Sydney 2000, Atenas 2004 e Pequim 2008. Foi eliminado na estreia em todas as ocasiões, mas contabilizou uma experiência que até hoje é inédita para os brasileiros da modalidade. Os Jogos do Rio de Janeiro serão os primeiros da história com representantes nacionais no badminton, um dos desportos mais populares do mundo.

O português é um dos 49 técnicos estrangeiros contratados pelo Comitê Olímpico do Brasil (COB) para tentar colocar o país-sede no top 10 do quadro de medalhas dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro 2016. Este é o segundo capítulo da série Made for Brasil, publicada às segundas-feiras, em que a Gazeta Esportiva apresenta perfis destes profissionais.

Diferente de outros treinadores estrangeiros, Vasconcelos teve poucos problemas de adaptação – encontrou boa recepção dos donos da casa nos Jogos Olímpicos, muitos com família de origem lusa pela relação histórica entre os dois países -, e já planeja até pedir cidadania nacional. Mas acabou surpreendido pela diferença na velocidade e no jeito de se comunicar.

“Até hoje, se atendo ao telefone a pessoa do outro lado não entende. Fala oi, oi, oi, várias vezes e aí me lembro que preciso falar com muita calma”, afirma o treinador. “Não foi um choque, mas fui aprendendo a conversar com as pessoas e elas comigo”, explica.

As pessoas com quem Vasconcelos mais conversa são os atletas da Selecção Brasileira permanente. Além dos treinos diários em dois períodos, convive com oito deles na casa em que moram a dez minutos de caminhada do centro de treinamento da Confederação Brasileira de Badminton (CBBD).

Foi o próprio treinador quem resolveu viver com os jogadores. Ele teria uma casa paga pelo COB à sua disposição e os atletas viveriam no CT. Mas as condições do alojamento oferecido aos jogadores não agradaram ao português, que conseguiu fazer a Confederação alugar um imóvel maior onde estão instalados até os Jogos do Rio 2016.

Os quartos são individuais. Cozinha, banheiros e sala, as áreas de convivência. Ao mesmo tempo em que deu aos atletas o conforto que julga necessário para competir profissionalmente, Vasconcelos instituiu em casa a rigidez dos treinos. Controla a limpeza dos ambientes, o descanso e a alimentação dos atletas.

Criou um regulamento, inclusive com horários a serem respeitados. Ninguém entra na casa depois das 22h30, por exemplo, afinal há treino no início da manhã em seis de sete dias da semana. E a experiência de atleta que já viveu com o técnico o deixa saber que as medidas não agradam todos os moradores.

“Não digo que exista uma guerra. Há um conflito e é preciso de um líder para fazer a paz. Tem que limpar e acabou. Isso não é bom para o atleta, mas é bom para o treinador”, explica Vasconcelos.

Mas mesmos entre os atletas fiscalizados pelo técnico, há quem goste da constante convivência. Ygor Coelho, que será o primeiro brasileiro a jogar badminton nas Olimpíadas, por exemplo. O carioca de 20 anos de idade vê a situação como uma oportunidade para obter mais informações para melhorar seu jogo do que se o contato se restringisse ao ginásio.

De segunda a sábado, o treinador português levanta no máximo às 6h30. Ainda em jejum, bebe água e então caminha até o CT nacional conversando com a mulher Tânia no trajeto. Faz exercícios na academia e às 7h já está dando treino ao primeiro grupo de atletas, com pequenas pausas para goles de água. Duas horas depois, um pão de queijo e um suco o deixam pronto para a sessão seguinte de trabalho, que se encerra às 11h.

No almoço, salada, alguma fonte de carboidratos e novo diálogo com a esposa para ter energia suficiente para o treino da tarde, das 15h às 18h. A noite é reservada para a revisão das atividades programadas para o dia seguinte, conversa com a mulher e os filhos Hugo e Laura, e uma vitamina – em Portugal fala-se batido.

Dois dias por semana, Marco Vasconcelos ainda vai correr no Parque do Taquaral. Mesmo aposentado como jogador, faz questão de manter a dieta, que pode mudar de acordo com novas informações divulgadas na internet, e a forma física para dar exemplo a seus atletas.

O bom preparo também o ajuda a aguentar as sessões de treinamento no abafado local de trabalho da Seleção, um galpão com teto de amianto na Rua Firmino Costa. Para não afetar a trajetória da peteca, o ar condicionado só poderia ser instalado a, no mínimo, dez metros de altura. Logo, não há.
O apoio psicológico do técnico Marco Vasconcelos vem de Portugal três vezes ao dia, em conversas com a família. Tânia, Hugo e Laura continuam na Ilha da Madeira porque a matriarca da família não quis se mudar para o Brasil com medo da violência. Ela, no entanto, concedeu ao treinador da Seleçcão a chance de trabalhar por três anos a milhares de quilómetros de distância mesmo que ele tivesse prometido ficar em casa após o fim da carreira de atleta.

Nas primeiras semanas de vida no País, o técnico luso sentiu-se culpado por mais uma vez afastar-se de casa, justamente quando tinha a chance de acompanhar o crescimento dos filhos, o que era impossível quando ainda jogava. Instalado provisoriamente em um hotel, chorava quase diariamente de saudades.

“Não vi a primeira palavra, não vi o primeiro dente e não vi o primeiro passo. Ao mesmo tempo, o pai leva a imagem dos Vasconcelos como um atleta de sucesso e um treinador que quer ser bom. Ainda não é, mas vai ser bom um dia”, diz o comandante nacional.

O começo deste caminho como treinador do Brasil foi em 2008, quando Vasconcelos tinha acabado de encerrar a carreira como jogador. O português ouviu dos amigos brasileiros Guilherme Pardo e Guilherme Kumasaka que um jovem atleta nacional queria passar uma temporada na Madeira treinando a seu lado. Era Daniel Paiola, que acabou perdendo a briga pela vaga nos Jogos do Rio 2016 para Ygor Coelho.

O trabalho com o atleta campineiro foi feito de graça – o brasileiro pagou apenas passagem e seu custo de vida em Portugal. Em 2012, os dirigentes da modalidade procuravam um técnico estrangeiro para comandar um estágio antes do Pan-Americano da modalidade. Paiola recomendou Vasconcelos, que ainda fez a preparação da equipe para o Sul-Americano antes de receber a proposta de comandar o Brasil em todo o ciclo olímpico.

“Claro que a química entre jogador e técnico conta muito, mas para mim ele é o melhor de todos”, avalia Paiola, que chegou a viver alguns meses na casa do treinador na Madeira em 2012. Na estadia, o atleta conheceu a importância que Vasoncelos dá à preparação física. Nem bem chegou à Ilha da Madeira, ouviu que precisava emagrecer se quisesse jogar em alto nível.

O português imaginou precisar de duas temporadas para corrigir os erros táticos e técnicos dos atletas nacionais, mas acabou surpreendido com a rápida evolução dos jogadores. O primeiro grande teste de seu trabalho foi nos Jogos Pan-Americanos de Toronto 2015.

O Brasil só tinha duas medalhas na história da competição – bronze de Guilherme Pardo e Guilherme Kumasaka no Rio 2007 e a prata de Daniel Paiola em Guadalajara 2011. O número foi superado no Canadá com duas pratas (de Hugo Arthuso e Daniel Paiola e das irmãs Luana e Lohaynny Vicente nas duplas) e outro bronze de Lohaynny Vicente (no individual).

“Tivemos anos perfeitos até agora”, resume Vasconcelos, que espera estender o bom rendimento dos atletas nacionais aos Jogos Olímpicos. E para o badminton nacional, isso não significa brigar por medalhas. Mas apenas vencer uma partida em sua primeira participação na história das Olimpíadas.

O País já teria uma vaga nas chaves individuais masculina e feminina, mas Marco Vasconcelos traçou a meta de classificar os atletas nacionais pelo ranking olímpico, baseado no mundial, mas com limite de representantes por nação. Ygor Coelho ficou com a 28ª vaga de 38 disponíveis. Lohaynny Vicente foi a 35ª.

O claro crescimento da modalidade não significa aumento no investimento. A CBBD não tem patrocinadores, apenas fornecedor de material esportivo. E mesmo com a recente evolução, os atletas nacionais ainda não podem pleitear o grau máximo de ajuda de custo do programa Bolsa Atleta, reservado a esportistas que já participaram das Olimpíadas. O badminton também não figura na lista de modalidades escolhidas pelo Ministério do Esporte para integrar o Plano Brasil Medalhas.

A Seleção Brasileira permanente, que começou com dez atletas, já conta com 17 participantes, mas sem mudança no orçamento. A recente desvalorização do Real ainda reduziu o salário de Marco Vasconcelos, fixado em moeda nacional, em comparação aos vencimentos que teria na Europa. Mas o treinador acredita que sairá do País mais rico. Pelo menos culturalmente.

O português se encantou pelos diferentes estilos de vida dos brasileiros, de acordo com suas origens sociais e geográficas, e pelo modo como é tratado pelas pessoas. Por isso quer pedir cidadania nacional, o que facilitaria sua permanência no cargo após os Jogos de 2016.

Vasconcelos acredita que a continuidade do trabalho poderia dar ao badminton brasileiro a chance de brigar por medalhas nas Olimpíadas de Tóquio 2020. Mas antes de fazer planos, ele sabe que precisará conversar novamente com sua família, já que inicialmente previu ficar só um ciclo olímpico longe de casa. Os filhos Hugo e Laura até são simpáticos à ideia de se mudar para o Brasil. A mulher Tânia, nem tanto.

“Hoje transporto a bandeira portuguesa igual transporto a brasileira. E as Olimpíadas do Rio vão ser como as de Sydney, em que dei a volta no estádio olímpico como atleta. Era o que mais desejava na vida, meu sonho de criança. Agora vou fazer como treinador e com certeza honrar a bandeira do Brasil até os últimos dias em que estiver aqui”.


Publicado em 23 de maio de 2016 10:00:24 - Fotos : Gazeta Esportiva

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